Design Thinking & Urban Mobility
[Challenge 1]
Fasten your seat-belts
Citymapper é um aplicativo de mapeamento de trânsito urbano, lançado em 2011. É usado para estimar rotas a pé, de bicicleta, de carro, e rotas que utilizem as diferentes modalidades de transporte público disponíveis em cada cidade. É um aplicativo para smartphone gratuito, que roda tanto em Android como em IOs.
Um dos problemas encontrados pelos usuários do Cittymapper nas rotas multimodais — isto é, aquelas que hibridizam diferentes meios de transporte em uma só rota — é a aquisição de diferentes bilhetes para cada um dos meios de transporte envolvidos, os quais nem sempre são vendidos no mesmo local, seja na bilheteria ou no próprio veículo. Seria possível usar os princípios de Design Thinking para dissolver as dores dessa experiência de usuário em particular?
Fair play: cons, but also pros
Designers são reconhecidos por empregarem a maior parte do seu tempo delimitando soluções, e não problemas. Por conta disso, considerei importante observar como o transporte público resolve problemas, para então me debruçar sobre seus pontos-cegos, e daí bolar soluções, num processo intenso de brainstorming. As entrevistas foram estruturadas ao redor do tema geral “transportes públicos”, e cada entrevista gerou insights preciosos para aprimorar a entrevista seguinte, melhorando o direcionamento das perguntas e a profundidade das respostas obtidas.
Durante as entrevistas, constatei vários motivos que levam os entrevistados a optar pelo transporte público. O fato de não haverem despesas adicionais no trajeto (como estacionamento, taxas federais pertinentes, etc) foi elencado como um grande atrativo, assim como a previsibilidade e abundância das viagens oferecidas principalmente pelo metrô (trens a cada dois minutos, menos diretamente afetados pelas intempéries), que colateralmente geram um planejamento de rota mais preciso. Também foram elencadas como vantagens a segurança (comparado ao transporte por moto, por exemplo), a liberdade que se estabelece ao se poder optar por diferentes meios de transporte (metrô, ônibus, aluguel de bicicletas e de condução individual) e a tranquilidade gerada por não ter que ficar ligado no fluxo dos carros ao redor, troca de embreagem, pedestres fora da faixa de pedestres, etc.
No entanto, como nem tudo é algodão doce, a experiência do transporte público também carrega suas dores particulares. Por exemplo, algumas modalidades de bilhete do metrô só aceitam o abastecimento de créditos até determinado valor, correspondente mais ou menos a dez passagens. Um passageiro que faz 2 viagens por dia precisaria recarregar o cartão a cada cinco dias, o que significa encarar uma fila potencialmente grande e demorada a cada cinco dias. A recarga do cartão, por sua vez, sempre é realizada in loco, porque as tentativas de desenvolver aplicativos/sites de recarga têm apresentado desempenho insatisfatório, como relataram os entrevistados. Uma questão frequentemente apontada foi a necessidade de andar com dinheiro em espécie, motivado principalmente pela ineficácia das alternativas de pagamento digital. Outro problema, mais específico das empresas de ônibus, é o tempo de espera entre uma rota e outra, que além de variar a depender da região, também pode ser altamente imprevisível.
Funnelling down
Para além de toda a pertinência da discussão sobre as vantagens e desvantagens dos transportes públicos, e trazendo a discussão para a esfera do desenvolvimento de aplicativos, as entrevistas que conduzi me levaram ao encontro de três dores muito presentes na experiência de planejar e executar rotas de comuta.
A primeira delas diz respeito à organização urbana do sistema de transporte. É evidente que diferentes cidades se organizam de formas diferentes em termos de zonas, distritos, bairros e malha viária, mas isso gera confusão para dois grande grupos de usuários de aplicativos de predição de rota: recém-chegados e turistas. Enquanto é cabível imaginar que recém-chegados irão se acostumar aos poucos com a nova rotina de comuta, a mesma lógica não se aplica a turistas, que geralmente ficam na cidade por um período curto e fazem rotas que provavelmente não vão se repetir.
Ainda no caso dos recém-chegados, outra questão que ficou muito nítida durante as entrevistas é como informações que são absolutamente cruciais para se compreender a organização viária da cidade não estão prontamente disponíveis, muito menos à vista fácil, mesmo nos canais oficiais de comunicação. Foi muito comum, entre os recém-chegados entervistados, o relato de que foi preciso um insider para obter informações acerca de bilhetes e descontos vantajosos, por exemplo.
Outra complicação, particular à modalidade de rotas multi-modais, é que em muitas cidades ainda não existe um bilhete avulso unificado para vários meios de transporte, o que iria cortar pela raiz o trabalho de ter que adquirir e gerenciar diferentes bilhetes (quantos de nós já fizemos uma rota iniciando no metrô e terminando no trem, compramos inocentemente dois bilhetes na ida, apenas para descobrir que na volta o bilhete do metrô não servia pra catraca da estação de trem?).
Finding solutions
Enquanto não tem muito o que ser feito em relação à disponibilização de um bilhete que funcione em qualquer catraca, uma proposta executável no escopo da UI/UX de um aplicativo seria uma funcionalidade para explicar as especificidades do transporte público de determinada cidade, tendo em mente os dois grupos citados anteriormente (e, francamente, até os nativos podem se beneficiar de um pouco mais de esclarecimento da malha viária da própria cidade).
- No caso do Citymapper, parece que a homepage deles estava esperando por uma nova feature desse porte: os nove botões com funcionalidades dedicadas a cada meio de transporte ficariam muito bem acompanhados por uma décima funcionalidade: a “entenda” (ou “Info”, ou “How to”, ou “Get it”, out “Coolio”, ou “The Dealio”, sugestões de título e rascunhos de potencial ícone se encontram ao final desse post), que se trata de uma seção para elencar as principais características da malha viária da cidade em questão, trazendo informações críticas para o gerenciamento de bilhetes de quem acabou de chegar.
- Outra funcionalidade que facilitaria a vida (no fantástico mundo onde bilhetes digitais são comprados sem maiores dores de cabeça) seria uma tela com o preço total de rotas multi-modais, oferecendo a opção de compra de bilhete só de ida (1 leg), ida e volta (“2 legs”/round trip), para mais de um passageiro (“Many heads”), e várias unidades de bilhetes da mesma rota (“Many legs”). Essa feature está esboçada na ilustração ao final do texto.
Final Thoughts
Provavelmente a lição mais valiosa dessa experiência foi descobrir que é imprescindível fazer uma micro-reavaliação a cada duas/três entrevistas para pensar se eu estava de fato fazendo perguntas que contemplavam o escopo do meu case. Não é o caso de bolar perguntas tão específicas cuja resposta vá se resumir a sim ou não, mas dar um mehor direcionamento à entrevista.
Esse processo também deixou bastante claro pra mim como muitos insights vêm desse formato mais aberto e mais despojado de entrevista, o que deixa o entrevistado à vontade para elaborar sobre tópicos sobre os quais o próprio entrevistador (no caso, eu mesmo 🙋♂️) não estava pensando originalmente, mas que se revelam fundamentais para a condução do case.